O ano que está terminando trouxe surpresas para o sistema de Franchising e expectativas que algumas marcas apontaram para 2023 não se confirmaram – enquanto outras surpreenderam o mercado. “Quando falamos sobre tendências e perspectivas, analisamos o comportamento mercadológico; observamos as conversas com clientes e profissionais do mercado, que ocorrem em eventos, reuniões e informalmente; a própria Economia e as intenções de expansão das marcas, para traçar um perfil do movimento que pode se firmar nos meses subsequentes”, pondera Thais Kurita, advogada especializada em Franchising e Varejo, com mais de 20 anos de atuação, sócia da Novoa Prado & Kurita Advogados.
Ela comenta que, no período em que os negócios se mostraram mais fortes após a pandemia, foi certeira a tendência da grande aposta no delivery e no crescimento do e-commerce, das dark kitchens e dark stores, movimentos que vieram para ficar. “Tudo isso faz parte da diversificação dos canais de varejo. É muito difícil uma empresa sobreviver com uma única opção de canal, atualmente – e a tendência é interagir com o cliente em todas as formas de abordagem e comunicação possíveis”, diz ela.
Falando em interação, Melitha Novoa Prado, sócia de Thais que acumula experiência de 35 anos como advogada das mais importantes franqueadoras brasileiras, lembra que os investimentos em comunicação diferenciada em cada canal é outra tendência que se confirmou no ano de 2023. “As marcas apostaram em diversificar a forma como conversam com seus clientes – e quem ainda não entendeu que isso é imprescindível não chegará até eles”, alerta.
A internacionalização, outra tendência apontada para 2023, se mostrou mais tímida: apesar de algumas empresas fazerem investidas com expansão no exterior, a desvalorização do Real diante de moedas mais fortes não motivou uma grande ida de marcas brasileiras para o exterior. “Como ainda há bastante oportunidade de expansão no mercado interno, as marcas preferiram continuar crescendo internamente, com menor risco”, avalia Melitha.
Em relação a cenários que não se concretizaram, o mercado esperava mais fusões e aquisições, que não ocorreram em 2023 com a mesma força que no ano anterior. “Não temos ‘notícias de bastidores’ sobre novas possibilidades, por enquanto, mas tudo pode acontecer no mercado”, diz Thais.
Em relação aos abalos citados, as especialistas se referiram ao pedido de recuperação judicial anunciado pela South Rock, operadora de marcas como Subway e Starbucks. “Essa notícia pode fazer com que os fundos de investimento olhem com mais cautela para o Franchising, de forma a haver mais exigências para investimentos”, pondera.
E como será o ano de 2024? Melitha Novoa Prado e Thaís Kurita apontaram dez tendências para o franchising para o ano que se inicia:
1) Micro franquias continuarão em alta
As micro franquias continuam como tendência de procura pelo investidor e foco de atenção das marcas. Há pontos importantes, aqui: o franqueador precisa entender que nada muda, em termos legais, de uma franquia para uma micro franquia, ou seja, todas seguem a lei 13.966/19 e, mesmo com baixo investimento, o processo de seleção deve ser rigoroso e o suporte, primoroso.
2) Indústria varejando
É uma tendência que estará cada vez mais presente. A indústria entendeu que, assim como Casa Bauducco, Omo, Ariel e outras indústrias têm no varejo uma forma de expansão, ampliação de seus canais de distribuição e melhora de relacionamento com clientes, elas podem usar o franchising não apenas como uma forma de escoar produtos, mas para se fazer presente na memória do consumidor.
3) Explosão de negócios com pouco know-how
Infelizmente, essa tendência pode se concretizar em 2024: uma grande oferta de negócios que oferecem pouco know-how e que não foram suficientemente testados podem atrair franqueados despreparados. É preciso que o investidor fique atento ao processo de seleção e só assine contrato após uma análise criteriosa do negócio.
4) Expansão sem critério
Da mesma forma, ainda existirá expansão sem critério como tendência para muitas marcas. Por meio de um processo de seleção rápido e praticamente automático, redes inauguram unidades franqueadas sem qualquer controle, oferecendo pouca transferência de know-how, suporte ineficiente e até fornecimento de produtos insuficiente. O resultado é o fechamento de unidades franqueadas em pouco tempo.
5) Aumento da judicialização dos conflitos
Está crescendo o número de redes no mercado, a cada ano – e muitas surgem de forma rápida, sem know-how. Isso gera também o aumento dos conflitos proporcionalmente – e eles são levados ao Judiciário. A consequência é a impressão equivocada de que franquia não é um bom negócio. Mas é preciso, mais uma vez, prestar atenção à marca escolhida, ao bom processo de seleção, ao know-how transferido, à capacidade de suporte do franqueador e aos documentos bem elaborados, que protegem a marca, mas trazem equilíbrio às partes, sem que uma se sobressaia em direitos e deveres à outra.
6) Humanização das relações
Se, por um lado, há marcas que decidem terceirizar todos seus problemas ao Judiciário, elevando o número de litígios, há uma corrente no Franchising que trabalha para promover relações cada vez mais humanizadas entre os parceiros, por meio da comunicação não-violenta, da empatia cuidadosa e da escuta ativa, além de treinamentos que permitem a promoção do diálogo e utilização de métodos adequados e pacíficos de solução de conflitos, como a negociação e a mediação. Essa tendência já está implantada em muitas redes.
7) Maior cautela dos fundos de investimento
Como citado, os fundos de investimento gestores de redes podem ter mais cautela ao se aproximarem das marcas, devido aos acontecimentos que fizeram com que a South Rock pedisse recuperação judicial. Mas não se extingue a hipótese de novos fundos assumirem a gestão de redes.
8) E-commerce e outros canais de varejo
As marcas que ainda não diversificaram seus canais de varejo certamente estão no caminho para o fazer, inclusive crescendo no e-commerce. Consultorias de delivery estão cada vez mais presentes nas redes, apoiando franqueados em suas atuações, e esse serviço já faz parte do suporte oferecido por muitas marcas para alavancar as vendas no delivery, por exemplo.
9) Inteligência artificial
O bom uso da tecnologia ajudará os franqueados a realizarem tarefas com mais eficiência e eficácia, deixando-os com tempo livre para ser estratégicos. Esse é o objetivo das franqueadoras, que estão apostando na IA como tendência para 2024.
10) Bancarização do sistema
Por meio de parceria com instituições bancárias de menor porte, crescerá a atuação de bancos interessados nos sistemas de franquia, passando a fazer parte desse ecossistema radial que é o franchising. Isso já acontece de forma tímida, mas a tendência é de crescimento exponencial em 2024.
Por Melitha Novoa Prado e Thais Kurita