Uma das primeiras franquias do Brasil, a rede sul-mato-grossense planeja dobrar de tamanho em seis anos, apostando no faça você mesmo. Com o fechamento da principal concorrente, a Peg&Faça, a tarefa ficou mais fácil
A inspiração do empresário gaúcho Lindolfo Martin para criar a varejista Multicoisas, uma das primeiras redes de franquia do Brasil, fundada em 1984, é, no mínimo, inusitada. Ele bolou o nome da empresa após assistir a um episódio da série de desenho animado ?Os Impossíveis?, do estúdio Hanna-Barbera. Entre os personagens estava o Multi-homem, um super-herói capaz de criar cópias de si mesmo. Com essa ideia de multiplicação na cabeça, Martin mudou-se, com sua mulher, Elza, de Maringá, no Paraná, onde trabalhava na fábrica de calçados da família, para Campo Grande, a capital de Mato Grosso do Sul, local escolhido para a abertura da Multicasa, pequena loja de materiais de construção.
Pouco tempo depois, ele percebeu que muitos clientes procuravam ferramentas e ferragens para pequenos reparos, dando origem à Multicoisas. No ano passado, a rede, atualmente com 170 lojas, faturou R$ 330 milhões. Neste ano, a expectativa é romper a barreira dos R$ 400 milhões. A meta para 2020 é ainda mais ousada: R$ 800 milhões. O poder da multiplicação, obviamente, não estava entre as capacidades de Martin. Com o crescimento da rede, o empresário decidiu profissionalizar a gestão. Após 30 anos à frente das operações, ele e Elza estão deixando a direção executiva da empresa, que passa, a partir deste ano, a contar com um CEO profissional.
O escolhido foi o executivo paulista Sandro Benelli, recrutado na França, onde trabalhava para o grupo Casino, controlador do grupo Pão de Açúcar. ?Tenho como meta pessoal alcançar um faturamento de R$ 1 bilhão, acima dos R$ 800 milhões estabelecidos pela empresa?, afirma Benelli, otimista. Para isso, ele se apoia em um conceito muito popular nos Estados Unidos e entre os franceses, que o conhecem como bricolage: ?faça você mesmo?. ?Contratar alguém para realizar pequenos reparos hoje é uma opção inviável?, afirma Benelli. Esse é um mercado que cresce na esteira do desenvolvimento do setor imobiliário. Quanto maior é o número de apartamentos vendidos, maior é a demanda por reparos ou reformas.
Com o elevado custo da mão de obra, resta aos novos proprietários colocar a mão na massa para reformar ou consertar seus imóveis. O caminho da varejista sul-mato-grossense ficou mais livre com o fechamento, no começo deste ano, de sua principal concorrente, a Peg&Faça, pioneira no setor de bricolagem no País. A empresa foi criada pelo Pão de Açúcar no início da década de 1980, e chegou a ser uma referência no segmento. No início do ano, no entanto, o grupo Pro-Home, controlador da rede desde 1994, decidiu encerrar as atividades, sem explicar as razões. A exemplo de outras grandes redes de varejo, como a francesa Leroy Merlin, a Multicoisas busca conquistar um público que está, cada vez mais, substituindo o chamado profissional ?faz tudo?: o feminino.
As mulheres demandam mais profissionalização?, afirma Lyana Bittencourt, diretora de marketing da consultoria Bittencourt, especialista em varejo e franquias. ?A tendência é de que esse mercado passe a ser formado, majoritariamente, por redes de lojas, como acontece no setor de farmácias.? A estratégia da rede para se diferenciar da concorrência é fazer uma venda mais consultiva. Cada loja da Multicoisas, que em média possui 100 metros quadrados, conta com, pelo menos, dez vendedores. ?Em um grande varejista, geralmente você encontra dois funcionários para cada 500 metros quadrados?, diz Benelli. ?Eu quero que o cliente saia da loja com uma solução.?
A praticidade é outro trunfo da companhia. Ao contrário dos chamados home centers, geralmente localizados em vias de grande fluxo, como as Marginais Tietê e Pinheiros, na capital paulista, a Multicoisas aposta em lojas de ruas e em shoppings. ?Somos o fast-food das utilidades domésticas?, afirma o executivo. Essa onda do ?faça você mesmo? está favorecendo, também, o setor de serviços voltados para o mercado de construção. Um exemplo dessa tendência é a Casa do Construtor, rede de franquias com sede em Rio Claro, no interior de São Paulo, que aluga ferramentas e equipamentos para obras e reformas. Atualmente com 200 lojas em quase todos os Estados brasileiros, a empresa pretende chegar a mil franqueados até 2020.
Os clientes não relacionados com o mercado de construção, excluindo pequenas empreiteiras e pedreiros, já representam 18% do faturamento, que foi de R$ 137 milhões no ano passado. ?O faça você mesmo está crescendo juntamente com o aumento do custo da mão de obra?, afirma Expedito Eloel Arena, fundador da Casa do Construtor. ?O problema é comprar uma ferramenta para um trabalho e ter de guardar o trambolho depois.? Hoje, a Casa do Construtor é um dos maiores compradores individuais de ferramentas elétricas do País. Em 2014, a empresa investiu mais de R$ 40 milhões na compra de equipamentos e planeja aumentar esse montante para R$ 60 milhões neste ano.
Fonte: Isto e Dinheiro.