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A longevidade das franquias: como resistir à tentação da geração de caixa imediata

Em artigo, Rodrigo  Chiavenato, diretor de franquias da Auddas, opina sobre o crescimento sustentável das redes. Confira

A longevidade das franquias: como resistir à tentação da geração de caixa imediata
Flávia Denone Publicado em 18 de Março de 2024 às, 08h00. Atualizado em 18 de Março de 2024 às, 11h00.

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O mercado de franquias no Brasil tem se destacado pela resiliência. Trata-se de um mercado que apresenta crescimento na casa dos dois dígitos mesmo em períodos de instabilidade econômica. Em comparação com 2022, o segmento de franquias cresceu 13,8% em 2023, com destaque para as marcas oriundas dos setores de alimentação, saúde, beleza e bem-estar, hotelaria e turismo.

Esses resultados refletem a capacidade de as franquias se adaptarem a novos modelos de negócios, incorporarem novas tecnologias e adaptação das marcas na busca por inovação. Diante de desafios como mudanças no comportamento do consumidor, avanços tecnológicos e concorrência acirrada, a transformação digital constante nas operações vem fortalecendo a adoção da omnicanalidade pelo segmento.

Outra característica marcante do mercado de franquias no Brasil é a diversidade de segmentos e oportunidades. Sob um modelo de negócio que combina a segurança de uma marca estabelecida com a autonomia do empreendedor, as franquias têm conquistado espaço e a confiança de investidores e consumidores.

Esse cenário promissor tem atraído diversos perfis de franqueados, porém, nem todos estão fadados ao sucesso. Em 15 anos de experiência no ramo de franquias, tenho observado que os franqueados mais bem-sucedidos têm em comum experiências profissionais em empresas que têm processos muito bem estabelecidos.

Geralmente, os franqueados que atingem os melhores resultados têm um legado de saber seguir regras e processos. Pouco se fala sobre isso, mas saber seguir regras é um ponto crucial para garantir uma relação sadia entre franqueado e franqueador. Na prática, o que tenho visto nos últimos anos, em muitos casos bem-sucedidos de franqueados, é a coincidência ou não de bons franqueados com bagagem e experiência profissional do mundo corporativo.

Esse debate é fundamental no mundo das franquias. O brasileiro tem aptidão para empreender, mas a maioria tem uma tendência a buscar atalhos para fazer o negócio acontecer do seu jeito.

Regras traçam caminho para sucesso

Na prática, a dificuldade em seguir um script, um passo a passo, pode ser a pista para identificar um CPF que terá dificuldades em se transformar em um CNPJ com resultados consistentes. Historicamente, no ramo de franquias, a prática me mostra que os empreendedores que trazem bagagens sólidas do mundo corporativo tendem a apresentar mais resultados e obterem sucesso mais rápido.

No mundo das franquias, não basta ter uma quedinha pelo setor. É um erro achar que se pode gerenciar com maestria uma franquia campeã no ramo de chocolates, por exemplo, por gostar muito do produto. O alinhamento de interesses é importante, claro, mas outras questões anteriores precisam estar muito bem resolvidas.

Outro erro muito comum é achar que não uma marca sólida de franquia pode render lucros capazes de pagar parte do investimento. No dia a dia, já vi muito franqueado ter apenas 50% do valor da franquia e apostar que o pagamento do restante será feito com o lucro do negócio, o famoso giro.

Essa prática é recorrente, principalmente em redes mais jovens. Há uma expectativa muito alta em atrair franqueados, mas não há uma avaliação fria sobre a capacidade de investimentos desses empreendedores. Um dos erros mais clássicos é o franqueado acreditar apenas no poder da marca. Por outro lado, há também uma pressão muito grande em cima das redes de gerar caixa no curto prazo.

Não se iluda com mágica do capital de giro

Se o negócio tem o custo total de R$ 200 mil, o investidor entra apenas com R$ 100 mil, acreditando que vai saldar a dívida, ou seja, quitar as parcelas com o giro do negócio. Esse é um dos maiores pecados no setor de franquia, porque o retorno pode demorar muito mais do que se imagina.

Além disso, o dia a dia de um negócio, franquia ou não, exige um capital de giro, seja para lidar com reposição de estoques, driblar emergências ou resolver problemas de RH. O franqueado muitas vezes não sabe – e ninguém diz isso claramente – que ele precisa ter uma reserva para garantir o capital de giro, sobretudo, nos seis primeiros meses de operação.

Há uma frase clássica no mundo dos negócios que se aplica muito a esse desconhecimento: o excel aceita tudo. Mas a verdade nua e crua sobre a necessidade real do capital de giro poucos responsáveis pela expansão da marca ousam dizer.

Também reparo uma falta de maturidade em algumas franqueadoras, que focam demais na captação de franqueados, sem um escrutínio de sua capacidade financeira ou na aptidão para gerir o negócio. Talvez um caminho seja desenhar uma política de aprovação mais bem definida. Isso deveria estar na pauta das franquias.

Entendo a pressão em gerar caixa. Se a régua é muito alta, consequentemente a quantidade de contratos efetivados vai ser menor. Mas é uma questão que precisa ser debatida para garantir a sustentabilidade do negócio e a imagem do setor de franquias.

E isso passa por trabalhar mais a linha de educação e a capacitação, que é uma bandeira da Associação Brasileira de Franchising (ABF). Enxergo uma preocupação muito grande da ABF em apoiar com a educação dos participantes do setor e em estruturar programas para capacitar e profissionalizar o segmento. Isso é uma estratégia necessária e muito inteligente no trabalho da associação para os próximos anos.

O setor de franquias no Brasil vai continuar se desenvolvendo, mas poderia ser ainda mais promissor se houvesse um trabalho fundamentado na capacitação dos franqueados. Do lado das franqueadoras, o aprendizado é evitar práticas de geração de caixa a qualquer custo, o que engloba a atração de franqueados despreparados.

A escolha do franqueado deve obedecer a alguns critérios inegociáveis. Essa etapa deve ser criteriosa como os processo de seleção em grandes empresas para cargos de liderança. Sem essa seleção correta, a consequência, a médio prazo, é um prejuízo para a franqueadora.

Tal como num reality show, os candidatos mais bem preparados para chegarem à final precisam apresentar doses de empatia, aptidão para trabalhar em equipe e solucionar conflitos e gerenciar suas estalecas, no caso o famoso capital de giro. Vence quem tiver mais resiliência e capacidade de se adaptar à evolução da tecnologia e às demandas do público. Quando isso não acontece, nenhum franqueado estará imune ao paredão.

*Por Rodrigo Chiavenato, que é diretor de franquias da Auddas, administrador BBA pela Life University (EUA), especialista em expansão de canais pela Georgia Tech e graduado em gestão de varejo pela FIA.

 

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